Wednesday, July 12, 2023

Amar é perder

 O imprevisível acontece.

Despontamos para a vida, que, imperativamente, se impõe nos escaninhos das nossas fímbrias.

Sonhamos, nas conversas sustentadas, nas interrogações que a nossa ignorância demonstra, em busca de respostas. Nem sempre são tão aceitáveis, como nos querem fazer crer. Idealizamos saídas outras para os dados que conhecemos, para as pressupostas saídas, que - (supomos...) - , são tão evidentes perante as situações e/ou relações, que nos parecem menos certas.

Nada disso se desenrola como queremos, ou forjamos, para que se torne uma realidade outra da que nos cerca.

S sociedade coarcta-nos realizações, que pairam ao alcance da alma, das mãos, e das sensações.

Já nada é para sempre.

Que prazer mórbido existe na maioria das pessoas em destruir sonhos, em gerar apatias e fugas à nossa premente necessidade, (como um imperativo categórico), de sermos minimamente felizes.

Acontece, por tal facto, haver tanta gente infeliz, ou, quando mais não seja, distante de si mesma, adormentada pela certeza, vivenciando dois mundos diversos, desagregados um do outro, alimentando lonjuras, sofreando fruições, esquecendo - ( ou crêem que assim é) - que, se cá estamos, temos que proporcionar, a nós e aos outros, a possibilidade de sermos completos, felizes, razão primordial para se querer à vida, para lutarmos por ela, para a sentirmos integralmente, bailando no olhar, e num sorriso sempre presente.

A vida é simples, e, no entanto, só a complicamos em descrenças, desavenças e maus amores. Entregamo-nos a eles com afinco. Podíamos aproveitar todos esses esforços muito mais proficuamente. Termos noites tranquilas e repousadas, em prolongamento de sonhos, de imagens, que nos alegrariam veredas cerebrais. Acordar num novo dia cada vez melhor - seríamos capazes de grandes e imediatas resoluções, sem pensarmos no que se seguiria depois.

É disto que se faz a maioria das relações, que, prática comum, nos dias que correm, descambam em ruptura, violência, desconformidade.

Mas uma das partes é a que mais sofre.

marcas que o tempo subsequente jamais apaga. Marcas que determinam que não possa, na maioria das circunstâncias, haver redenção, ou, pelo menos, fazer-nos acreditar que há  uma porta, que um dia se poderá abrir para o caminho certo.

Já alguém disse, - (Picasso?) - que  "a vida é uma obra de arte em que não existe borracha".



Sunday, July 9, 2023

"Descarga" 

O imperativo de voltar à escrita tem-me "assaltado" vezes sem conta.

Os imprevistos e as contrariedades, consecutivos e constantes, têm relegado para depois tudo quanto possa produzir de novo, reformular o já realizado, e dar por concluídos textos em suspenso há alguns anos.

É urgente que retome tudo. Faz-me bem ao espírito, ao "ego", e à minha vida solitária.

As esperas são, para mim, nos tempos que correm, demasiado longas e cansativas. Forçam-me a retardar o meu passo, muito mais do que era habitual. A minha força anímica tem vindo a esvair-se. Para tudo. Até andar é extremamente difícil e exaustivo.


                                                            12/10/2021

                        Bomba da Galp, 2ª Circular, inspecção do gás na AutoGeRv   


Tuesday, April 25, 2017

Começaram...

...(finalmente!), as obras de limpeza da ribeira de Odivelas.
Mas parece-me que a colónia de patos não gostou da "novidade" - já se vêem muito poucos. Os que são observáveis confundem-se, quase por mimetismo, com o lodaçal que grassa.
Onde antes se viam águas l(í)/(i)mp(idas)/(as), agora só a negritude se escoa no caudal lento, e pouco abundante por estes dias. Paira no ar o cheiro desagradável de águas apodrecidas. - (Relembrando que, dantes, se conhecia como "praia de Odivelas", remete-nos para o fedor de maresias esvaziantes de esgotos...) -
Que tristeza?!...
Aguardemos que a promessa das autárquicas nos traga, ainda, a drenagem do leito...
Seria louvável.

Gosto muito da quietude, do idílico ambiente, da paz que nos transmite, dos volteios e chilreada da passarada, da proximidade dos pombos, que se abeiram em busca de côdeas, das brincadeiras com que nos distraímos vendo os cães correndo felizes pelas veredas, ou gozando o frescor da relva...
Preservemos o que nos possibilitam, para acreditarmos que ainda se vai restaurando, reaproveitando, rearranjando o que a natureza nos oferece.

Ramada, 26 de Abril de 2017, (02h:33')

Tuesday, October 18, 2016

Eu e a DIVULGA ESCRITOR

Ana Maria de Oliveira Dias - Entrevistada

Ana Maria de Oliveira Dias - Entrevistada
Por Shiley M. Cavalcante (SMC)

Ana Maria de Oliveira Dias nasceu no centro de Moçambique, em 1952. Com cerca de quatro anos começou a ler, por imperativo pessoal de tentar fazer companhia aos pais, que aproveitavam os tempos livres esmiuçando tudo o que lhes pudesse proporcionar algum conforto e actualidade no mundo em que se movimentavam. Boa aluna, foi sempre estimulada pelos professores. Escrevia por gosto, sedimentado na paixão da leitura. Por contingências várias veio para Portugal para fazer a sua Licenciatura em Filologia Germânica. Como professora tentou inculcar o gosto quer pela leitura, quer pela escrita, nos alunos. Escrever por vezes é compulsão, outras vezes necessidade de expurgação. Um espírito crítico, rejeita situações desconformes. Na mole imensa, há necessidade de nos fazermos ouvir e “abanar os alicerces” que descambam para vias inadmissíveis ou “encapotam” males subreptícios. Inquieta, insatisfeita, perfeccionista – sintomas que não permitem dormências. Estar-se vivo é uma benesse gratificante.

“Pelo que creio, os leitores da Divulga Escritor serão, também, autores, e, para eles, um apelo: não deixem morrer a verve, não esmoreçam se um dia não sai tão bem;”

Boa Leitura!

Escritora Ana Maria Dias, é um prazer contarmos com a sua participação na Revista Divulga Escritor. O que mais a encanta na arte de escrever?
Ana Dias - Tenho, antes de mais, que agradecer a deferência e a oportunidade que me foi concedida pela Divulga Escritor. Dependendo do estado de espírito, ou das vicissitudes, escrever é quase um dever, aliciante, apaziguador, de preenchimento de vazios, uma forma de me projectar para além da solidão, do desespero, da minha desconexão com o mundo circundante. É muito variável cada momento de escrita; há sempre uma razão a despontar na ponta do aparo... 

Em que momento se sentiu preparada para publicar o seu primeiro livro solo?
Ana Dias - A primeira vez que tencionei publicar o meu espólio (já lá vão cerca de trinta anos), tive que desistir por incapacidade de cumprimento das exigências da editora (em termos monetários). A primeira obra surge como meio de ultapassar uma profunda depressão, e depois de ter rejeitado os tratamentos que me eram impostos pela psiquiatra. «Contos em Noites de Lua Cheia» (2012) resulta numa crítica de costumes; é um retrato com toda a “cor local” da Lourinhã – inacreditável para muita gente, mas absolutamente verídico: doeu-me escrevê-la, mas foi a melhor opção que poderia ter assumido. Muito mais haveria para expor, já a tenho tentado revisar, mas não sou capaz hoje – teve a sua pertinência; resultou como terapia.  

Você tem vários livros editados pela EuEdito. Qual dos livros lançados pela EuEdito demorou mais tempo para ser escrito?
Ana Dias - Não é fácil indicá-lo. Tudo depende dos envolvimentos exteriores. Mas as críticas e/ou ensaios obrigam a estudos mais rebuscados. Trabalhar fechada numa concha – vivo só e, apesar de ser hiperactiva, há uma concentração que se perde na minha inquietação saltitante, e na minha inconformação constante. Tudo é variável. Mede-se o “tempo” pela delonga que nos criam as vicissitudes?

Ana, nos apresente “Lisboa Anos 70”, pode ser?
Ana Dias - «Lisboa Anos ’70» reúne uma série de escritos realizados durante essa década, desde que cheguei a Portugal. A maior parte (a primeira) contém prosa; e a segunda, poesia. Era muito jovem, mais na minha forma de encarar o mundo que em idade física. Uma sonhadora, alegre enamorada da vida. Vim para Portugal sem outra alternativa, digamos assim, mas quis sempre voltar a Moçambique, onde sempre fui feliz; a vida era descomplicada. Em inícios de Dezembro de1971, escrevi isto:

Vou partir
Eu quero partir, esquecer... esquecer...
O manso marulhar dos coqueiros
Chama-me
E eu sinto uma nostalgia indizível
Que me empurra, que me atrai magneticamente
Com força brutal para o berço negro da terra africana
Não queiras prender-me à morte:
Deixa-me ir – eu quero partir!...
Quero sentir minhas veias impadas de sonho cafreal,
Quero ouvir o som longínquo do batuque na sanzala
E imaginar-me rebolando-me ao som trepidante dum Kwela,
Quero drogar meu cérebro com o odor das acácias em flor
Deixa-me partir... esquecer,
Esquecer o ano perdido no caos de uma ilusão
Que se escoou morosamente ao rítmico matraquear da revolta
Deixa-me, deixa-me partir, fugir, esquecer
Tenho os olhos cheios da maresia luarenta da Baía,
Tenho o peito adormecido nas asas das gaivotas bailando dengosamente na ressaca,
E sinto-me morrer ao apelo clangoroso do bananal...
Quero rasar meus braços na lonjura,
Quero abraçar-me à sombra resinosa do eucalipto...
Mas é tão vasto o mar, tão distante o sonho
E eu quero!, quero-me em terra africana!
Quero a nostalgia transformada em poesia!

Com relação aos livros que são peças de teatro, qual é a mensagem que você quer transmitir ao leitor através dos enredos que compõem a obra?
Ana Dias - As duas peças de teatro estão insertas num mesmo volume, muito ligeiro, que surgiu por um desafio a que, depois, não respondi.

«Rosário de Contas» – peça com XIII cenas relatando vivências e confrontos entre jovens, estudantes universitárias, ou não, de procedências e expectativas bastante diferenciadas. Decorre, principalmente, num lar de raparigas. É de alguma forma autobiográfico, mas o “volte-face” é dado pelas saídas por que cada personagem busca. Um alerta para que as raparigas não se percam nos seus intentos, quaisquer que eles sejam, ainda que as tentações à volta conduzam a desgastes, por vezes desnecessários.

«Café-Concerto» – peça em II actos: tentativa de libertação da mulher das grilhetas impostas pela sociedade: é passada essencialmente num bar, onde se acoitam almas solitárias em busca de sons para adormecerem o espírito num copo, que inebrie os sentidos e ajude a aligeirar a pressão da vida.

Onde podemos comprar os seus livros?
Ana Dias - A maioria das minhas obras pode ser solicitada à EuEdito, que tem Livraria On-line e que as remete com bastante presteza. Com a EuEdito estabeleci um acordo, que me agrada sobremaneira – serviço limpo, rápido e que não é nada oneroso (para o que se pratica por aí, com as editoras que se conhecem). O meu principal problema é deixar editados, e registados, os meus exercícios de escrita.

Você já participou de várias antologias e colectâneas. Qual foi a participação que mais a cativou? Por quê?
Ana Dias - Há várias, todas de poesia. As razões são comuns: os desafios lançados ou me cativaram sobremaneira ou me “apanharam” em maré proveitosa. A das «Décimas», dos Horizontes da Poesia, a «Quatro Poetas», da Papel d’Arroz, a algarvia «Terra Luz» e outras mais que, de momento, não me ocorrem.

Quais são os seus principais objetivos como escritora?
Ana Dias - Dizer que não nos importa sermos, ou não, conhecidos, é absurdo – é evidente que todos os que escrevem gostam de ser reconhecidos pelo seu mérito. Os meus principais objectivos prendem-se com o facto de querer deixar tudo “arrumado” e evitar tropeçar em papel disperso por pastas e/ou gavetas – ainda manuscrevo, primeiro, e só depois passo ao computador. Vou sendo (re)conhecida através das Antologias em que participo, o que é bastante recompensador.

Pois bem, estamos chegando ao fim da entrevista. Muito bom conhecer melhor a escritora Ana Maria Dias. Agradecemos a sua participação na Revista Divulga Escritor. Que mensagem você deixa para os nossos leitores?
Ana Dias - Pelo que creio, os leitores da Divulga Escritor serão, também, autores, e, para eles, um apelo: não deixem morrer a verve, não esmoreçam se um dia não sai tão bem; há muitos e mais felizes momentos na vida de um(a) escritor(a). Desistir é que nunca.
Muito obrigada à Divulga Escritor. Foi uma honra para mim poder figurar nesta Revista. Bem hajam.


Divulga Escritor unindo Você ao Mundo através da Literatura



Leia mais: http://www.divulgaescritor.com/products/ana-maria-de-oliveira-dias-entrevistada/?utm_source=copy&utm_medium=paste&utm_campaign=copypaste&utm_content=http%3A%2F%2Fwww.divulgaescritor.com%2Fproducts%2Fana-maria-de-oliveira-dias-entrevistada%2F

Tuesday, September 27, 2016

"Fac lux!"

A vida passa... Tanto se me dá que corra, ou deslize: estou a esgrimir-me com ela. Aceito o fim da linha como benção. Tarda o descanso.
Um tormento a minha vida, de que pouco me ouvem lamuriar - estou sem alma para nada, sem ânimo para lutar, para ressurgir.
Dormir é tudo o que me conduz ao "oblivium"... Um limbo, sempre.
Pensar em fazer o que quer que seja, dói, custa, delassa-me - fico e nada sou; parto e não sei para onde, ou por onde pisam os meus passos. 
Que cansaço?! Ou talvez nem isso. 
Não estou onde quero - e onde me quero? 
Não faço o que desejo - e o que é que anelo? 
Nunca me senti - se isto é sentir?!... - tão amorfa, invadida, destruída, derruindo lentamente.
Tudo perdeu o sentido. 
Ah! Mário de Sá Carneiro!
Somos o incomensurável espólio do absurdo.
Não me gosto deste modo e de outro qualquer já me desgosto.

Vale Vite, 28/09/2016, (01h:00')

Thursday, January 28, 2016

"Bajirao Mastani"

Vida e sonho, nem sempre, (ou nunca), andam de mãos dadas.
Tenho adiado, que mais não seja, uma referência ao filme com o título em epígrafe. Preguiça? Desconcerto? Inapetência? Sei em que ponto se (des)encontra a minha auto-estima: a contínua antinomia de choque entre o que quero e faço por conseguir, sem prejuízo ou dolo no(s) outro(s), e o que o(s) outro(s) persiste(m) em destruir, idiotando que sou eterna, e, provavelmente, indestrutível e imune à dor, deixa-me sempre na absurdidade execrável de "permanecer" "à espera de Godot".
Há que fazer esforços terríveis para me movimentar, enfrentar o mundo e ser capaz de olhar, (vendo!), tudo quanto se move à minha volta, e/ou dignar-me a encarar o(s) outro(s). Lástima, somente.
Há anos atrás, alguém me dizia que eu era, "infelizmente, um cofre aberto". Não o entendi, muito bem, então. As paranormalidades foram sempre um campo reservado, que evitei aprofundar, como me escusei, na grande maioria dos casos, de me assumir como "bafejada" por uma "terceira visão". 
"Cofre aberto": funcionando, por antítese, com o mito da "Boceta de Pandora". Absorve-se tudo, limando arestas, limpando males, abrindo caminhos, mas, (muito) raramente em meu benefício - quem os aproveita são sempre os outros, que, egoisticamente, se empafiam de qualidades e atributos, que não possuem, mas têm a "esperteza" de se aprop(r)i(nqu)arem do que não devem, e efectuarem o que bem lhes passa pela cabeça, sopeando, denegrindo as bençãos que lhes são ofertadas. 
"Quem não vive para servir, não serve para viver". Qualquer garotinho aprende este lema, tão logo se disponha a ser escuteiro. Ensinou-mo meu pai. Entre muitos outros, que me norteiam, ainda, e apesar das vicissitudes.
Não é "choradinho", não é vitimização - são factos, fenómenos, (in)consequências: "a palavra e a pedra, depois de lançadas, não têm retorno". Depois, "quem não se sente, não é filho de boa gente"...
Reformulei, por observação "no terreno", vários ditados populares, por os considerar, ou pouco abrangentes, ou incorrectos.
Calar, nem sempre significa que se consente, ou anui - é, muitas vezes, preferível poupar saliva e Latim - nem todos possuem um Q.I. mínimo, que possa atingir os liminares pressupostos do que pretendemos dizer, quando emitimos qualquer juízo, de valor, ou não. Ser-se dotado, é muita outra coisa. Sub(-), ou sobre(-): andam próximos os "sintomas"; "minglam", (recorrendo a um neo-logismo, que me surgiu agora...) Saber "separar as águas", é a questão fundamental. 

Sou uma simplista. Uma surpresa agradável é um deslumbramento.
A possibilidade, que me foi concedida, de assistir a este filme, foi uma dessas ocorrências.
Tive, ainda, o privilégio de assistir à exibição de uma dançarina indiana. Um perfeito regozijo de plenitude, em que os sentidos, estimulados, me proporcionaram fruições inenarráveis.
Partindo de uma lenda indiana, a crença, o amor, (em diversas vertentes), as ligações humanas, (de poder, sempre presentes), prendem-nos até ao fim. O filme é longo. Uma tela viva, onde se movem realidades, fantasias, poesia - muita, em todos os parâmetros!
Sou siderada por realizações indianas. Acho que desde que tomei contacto com as coleguinhas dos meus primeiros tempos de escola. Seguiram-se os filmes: não perdia nenhum em Moçambique. 

Não sei se ainda estará em exibição.
A não perder! Decididamente.
A quantidade de fotógrafos e repórteres, que "giravam" entontecidos pela luz, beleza, esplendor, que inundaram a sala, não me deixam mentir, nem parecer "suspeita".
É glorioso. Avassalador. "Lindo de morrer", qualquer que seja o vector, por que abordemos a "fita".

   
Ramada, 29 de Janeiro de 2016, (05h:33')


  

Sunday, August 2, 2015

Eu e a vida em mim

Fui operada dia 19, Domingo, nas Urgências - falarei depois sobre isto, porque, desde há cerca de quatro meses, tudo tem sido de um vampirismo inexplicável.

Havia-me esquecido de um episódio posterior de uma beleza extrema, mas sem surpresas. A vida proporciona-me destas doçuras, que me alimentam a alma e me determinam uma grandeza enorme de enamoramento da vida  na minha pequenez neste imenso universo que Deus, (?), me ofertou.
Tinha um esquentador-inteligente - (ahahah...) - no Vale Vite. Deixava-me sempre ensaboada, correndo nua pela casa para o voltar a ligar... quantas vezes? Vezes sem conta: o safardana entendia que devia tomar o meu banho "à macua" -  quem é de Moçambique entende o que quero dizer. 
Chiça! Nem lá fazia disto, que o meu paizinho era esperto demais e construiu chuveiros com reservatórios, quando estivémos em Magude, nos anos '50.
Saturei-me e decidi-me a adquirir um termo-acumulador - não como o que tínhamos em L.M. nos anos '60, de 200Lts, mas um que me permitisse tomar banho e regalar-me como se a água morna da chuva me devolvesse as eutimias que busco todos os dias.
Os "técnicos" - vindos de expresso da suíça, algures nas berças! Careiros como o raio que os parta! - foram "montá-lo" na terça, 21 de Julho.
Na necessidade de irem ao "carro de apoio", o chefão chama pelo outro para ir ver uma "coisa".
Um pardal entrara no átrio, ou descera do telhado, onde os oiço chilrear.
Corri para abrir a porta, para que fosse em liberdade.
Diz o outro: "ainda ninguém conseguiu explicar porque é que um pardal não consegue viver em cativeiro..."
Verdade. Tentei salvar um, ferido, em tempos, e não resistiu.
O tonto, desvairado, vai de encontro à metade da porta que estava fechada, bateu de bico, e caiu redondo. 
O "ajudante" do técnico olha para mim: "Então? Morreu?"
"Não! 'Tadinho. Desmaiou com a pancada!"
O homem pegou nele, pô-lo debaixo da torneira e ele foi "acordando", muito lentamente.
Peguei nele, fiz-lhe festinhas, fui pondo água no bico, que foi engolindo.
Tenho uns sacanitas que me chateiam sobremaneira no meu varandim - comeram-me as malvas; mudei de plantas, o resultado é o mesmo; sujam tudo, chafurdam (n)a terra, em busca do que entendem, desafiam a minha paciência, e "cantam-me cantatas" descaradamente, manhã cedo, ou o dia todo.
Abri as janelas da sala, e tentei que partisse, forçando-o a apoiar-se no parapeito. Fingiu-se de morto, ou "alma penada", de olhos a dizer adeus.
Aconcheguei-o na concha das minhas mãos.
"Então? Vai! Olha os outros a chamarem-te..."
Num repente, levantou vôo e partiu para um terraço pertinho das minhas janelas.
"Nasce-se muitas vezes", diz Mia Couto.

Cresceu em mim a serenidade da certeza de que a vida é a maior das maravilhas de todos os tempos!
Não foi a primeira vez, que isto aconteceu. Tem sempre resultado, à excepção do outro, de patita partida, que quis que fizesse a recuperação na gaiola.   

   Ramada, 03/08/2015, (entre as 03h:00 e as 04h:00')